Oficialmente, o Tratado de Amizade, Comércio e Navegação Brasil-Japão foi assinado em 5 de novembro de 1895, porém, o efetivo intercâmbio só ocorreria a partir de junho de 1908, com a vinda dos navios trazendo imigrantes japoneses como mão-de-obra para a cafeicultura paulista.
A adaptação deles numa terra distante, com clima, alimentação, cultura e idioma diferentes foi difícil, é claro, mas conseguiram se manter e, após dois anos de contrato na fazenda, saíram para se tornarem agricultores independentes, alugando ou adquirindo pequenas propriedades.
Numa segunda fase, empresas japonesas adquiriram terras em áreas afastadas e construíram a estrutura básica de uma comunidade rural, dividindo o espaço em lotes e vendendo os mesmos para os imigrantes que já residiam no Brasil ou para aquelas famílias que iriam emigrar para o Brasil. Posteriormente, esses núcleos de japoneses se transformaram em bairros e depois em municípios, como é o caso de Bastos, Pereira Barreto, Registro e Promissão no Estado de São Paulo, Assaí, no Paraná, e Tomé-Açu, no Pará. Cidades mais próximas de São Paulo também receberam muitas famílias de japoneses, como Mogi das Cruzes, Suzano, Ibiúna e Cotia, produzindo, até hoje, principalmente verduras e frutas, e formando o chamado Cinturão-Verde de São Paulo.
No período anterior à Segunda Guerra Mundial, foi registrado o ingresso de 188.906 japoneses no Brasil e a maior parte permaneceu na agricultura durante um bom tempo, até seus filhos se formarem e procurarem outras profissões.
Diversificação na alimentação
A chegada dos japoneses trouxe uma diversificação na mesa do brasileiro. Variedades como cebolinha, acelga, berinjela, pepino japonês, kabocha e moyashi foram introduzidas no mercado pelos japoneses e seus descendentes. Frutas como caqui, ameixa, maçã, ponkã e dekopon foram cultivadas inicialmente pelos japoneses, sendo que algumas variedades tiveram ajuda do governo japonês, que enviou pesquisadores para estudar e adequar o fruto ao solo e clima locais.
Foi inegável a introdução de novas técnicas na agricultura, mesmo para a produção de alimentos já existentes do Brasil, como alface, tomate, cenoura, batata, abacate e manga. Houve também uma grande contribuição na avicultura, com o desenvolvimento de técnicas e equipamentos que melhoraram a produtividade, principalmente de ovos.
Associativismo
Outra grande contribuição se deu no sistema organizacional da agricultura. No Brasil do início do século 20, a área rural estava dividida entre grandes fazendeiros, que praticavam a monocultura (café em São Paulo), muitas terras sem cultivo (levantamento de 1920 revela que apenas 0,8% do território brasileiro eram cultivados ou considerados aráveis), e pequenos proprietários, que plantavam o que comiam e vendiam o excedente na cidade mais próxima. Assim, a distribuição da produção era precária.
Os japoneses cultivavam em áreas pequenas café, algodão e outros, mas o volume não era suficiente para uma comercialização direta nos mercados, dependendo sempre de um intermediário, o que acabava diminuindo sua renda, evidentemente.
Imigrantes japoneses tinham conhecimento das cooperativas agrícolas, uma vez que no Japão, a Lei das Associações Agrícolas, de 1899, já regulamentava essas entidades. Isso motivou a criação de cooperativas no Brasil. Num dos casos, da Cooperativa Agrícola de Cotia, fundada em 1927, começou com a dificuldade de vender batatas diretamente no Largo da Batata, em Pinheiros, onde havia o entreposto comercial. Assim, os agricultores, principalmente da região de Cotia, se associaram, formando um volume razoável de produção. E ao mesmo tempo, conseguiam comprar e transportar fertilizantes em grande quantidade, permitindo uma negociação mais favorável. O modelo deu certo, e a contratação de técnicos por essas entidades para atender vários agricultores, levou ao aprimoramento em qualidade e produtividade.
Chegam os imigrantes do pós-guerra
Nas décadas de 1950, 1960 e até o início de 1970, o Brasil receberia um novo grupo de imigrantes japoneses, desta vez, jovens na sua maioria e com formação em nível colegial. Muitos deles vinham a convite da Cooperativa Agrícola de Cotia, através de um programa da Federação das Cooperativas Agrícolas Japonesas, e foram trabalhar nas fazendas de agricultores nikkeis e com isso conseguiam se ambientar mais facilmente no Brasil.
Esse novo grupo de imigrantes vinha de uma realidade diferente, pois saíam de um Japão do pós-guerra, que estava melhorando de forma muito rápida, diferente daquele país dos antigos imigrantes. Assim, os jovens que vieram para o Brasil saíram atrás de um sonho, de ter sucesso numa terra muito maior, o que seria impossível de se realizar nas vilas em que moravam.
Nessa mesma época, as cooperativas agrícolas registraram um grande crescimento, oferecendo crédito e os mais variados serviços para seus associados, auxiliando os agricultores e seus familiares.
Abrindo novas fronteiras agrícolas
A Cooperativa Agrícola de Cotia em conjunto com o Governo de Minas Gerais iniciou o Padap – Projeto Agrícola do Desenvolvimento do Alto Paranaíba, com o objetivo de desenvolver a agricultura no solo pobre do Cerrado Mineiro. Melhorando o solo e desenvolvendo a irrigação, aquela grande área era uma nova fronteira agrícola importante para o Brasil. Esse projeto ia de encontro com os anseios dos jovens agricultores, que poderiam produzir em grande escala, tendo o apoio logístico de uma grande cooperativa. Em 1971, os pioneiros começam a se instalar na região de São Gotardo.
O começo desse empreendimento foi difícil, porém, depois de alguns anos começava a dar resultado. Foi quando o governo federal criou um programa semelhante abrangendo outros estados brasileiros. O Japão, que estava num grande ritmo de crescimento econômico, viu ali uma oportunidade de produzir alimentos para a sua população, que também estava aumentando. Em 1976, o presidente Geisel assinou um protocolo de cooperação econômica com o Japão, e contando com a participação de outras entidades, foi criado o Plano de Desenvolvimento do Cerrado – Prodecer, executado em diversas etapas, e a Cooperativa de Cotia levou seus associados para desenvolverem essas terras.
Hoje, essa região do Cerrado produz uma grande variedade de produtos, como a soja, onde o Cerrado representa 48% de toda área plantada desse grão no Brasil.
Além da soja, o milho, o algodão e o feijão ocupam lugar de destaque na região, mas há também a presença do café, da cana-de-açúcar, do arroz, do tomate, do alho, da cenoura e de diversas frutas, como melancia, manga e abacaxi.
O desenvolvimento de novas fronteiras continuou em outras regiões, com a participação das cooperativas de Cotia e Sul-Brasil, além de outras empresas japonesas e nikkeis. Assim, a expansão agrícola se deu na Bahia, Pernambuco, Santa Catarina e até Mato Grosso, contribuindo bastante no abastecimento interno e na exportação brasileira.
Ainda contribuindo na agricultura
Passados 117 anos a partir do início da imigração japonesa ao Brasil, é certo que muitos descendentes nunca trabalharam no campo, mas mesmo assim, a contribuição deles na agricultura continua firme. São muitos os agrônomos formados pelas melhores universidades brasileiras, que foram trabalhar na pesquisa, melhoramento e desenvolvimento de novas variedades de cultivos, tanto nas entidades de pesquisa, em universidades e nas empresas. Outros, atuam na área de produção de sementes, fertilizantes e equipamentos agrícolas, e muitos outros no setor comercial. Não há dúvida que todos eles contribuem para melhorar a agricultura brasileira.
A história dos imigrantes japoneses e seus descendentes está repleta de sucessos obtidos pela insistência, de pessoas teimosas e obstinadas, que chegam a passar a vida inteira em busca de um produto melhor, ou do desenvolvimento de uma nova variedade ainda não cultivada no Brasil. É o que traz inovações e descobertas que acabam por influenciar e criar oportunidades na agricultura brasileira. São essas pessoas que a Comissão Bunkyo Rural Kiyoshi Yamamoto procura identificar para homenagear no consagrado Prêmio Kiyoshi Yamamoto.





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